Ofício protocolado pelo Fórum Verde Permanente na Prefeitura Municipal de São Paulo. Acesse aqui!
As mudanças climáticas estão provocando alterações em um ritmo mais rápido do que previu a ciência, até porque as emissões de gases de efeito estufa – GEE – continuam aumentando no mundo, em total desacordo com os compromissos dos países no âmbito do Acordo de Paris, de 2015.
O período de estiagem recorde no país, afetando mais de 50% do território, associado a um número sem precedentes de queimadas que destroem biomas e também coberturas florestais no Estado de São Paulo, queimadas estas apontadas como criminosas por autoridades e estudiosos, tem exposto uma parcela significativa da população a uma fumaça tóxica que provocou e continuará provocando graves problemas de saúde, por muitos anos.
Diante desse cenário gravíssimo, continuar agindo como o poder público tem agido não é só insuficiente, é inaceitável!
Por isso, no dia 27 de setembro de 2024, o Fórum Verde Permanente protocolou um ofício na Prefeitura Municipal de São Paulo com diversos questionamentos ao prefeito Ricardo Nunes e aos seus secretários sobre o assunto. Veja o texto completo do ofício a seguir.
A população da cidade quer respostas, pois novos eventos climáticos extremos acontecerão, inclusive no próximo verão, e não podemos continuar desamparados como ocorreu durante o apagão do final de 2023 e agora durante as queimadas de 2024.
Entre outras coisas, precisamos de correções de rumos e de ações para maior resiliência frente a esses eventos e precisamos para já!
De: Fórum Verde Permanente de Parques, Praças e Áreas Verdes
São Paulo, 26 de setembro de 2024.
Exmo. Prefeito Municipal de São Paulo (PMSP), sr. Ricardo Luís Reis Nunes
Exmo. Secretário de Governo Municipal (SGM), sr. Edson Aparecido dos Santos
Exmo. Secretário Municipal de Segurança Urbana (SMSU) em exercício, sr. Alcides Fagotti Junior
Exmo. Secretário Municipal das Subprefeituras (SMSUB), sr. Alexandre Modonezi
Exma. Secretária Municipal de Urbanismo e Licenciamento (SMUL), sra. Elisabete França
Exmo. Secretário Municipal do Verde e do Meio Ambiente (SVMA), sr. Rodrigo Pimentel Pinto Ravena
Exmo. Secretário Executivo de Mudanças Climáticas (SECLIMA), sr. José Renato Nalini
Assunto: medidas para maior resiliência da cidade aos eventos climáticos extremos, incluindo a preservação, recuperação e a ampliação das florestas urbanas, coberturas arbóreas e demais áreas verdes.
A população de São Paulo ficou sufocada por mais de uma semana neste mês de setembro em função da poluição gerada por gigantes queimadas em diversos biomas brasileiros e por todo o Estado de São Paulo. Neste Estado, inclusive, foi vergonhosamente superado o recorde histórico do registro de queimadas do Programa Queimadas do INPE[1] - Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais, ao alcançar 7.193 até o dia de 16 de setembro, mais do que o dobro da soma dos dois anos anteriores inteiros.
Em sua grande maioria essas queimadas são, como apontam especialistas e autoridades, provocadas por ações criminosas, com uma parcela com indícios de serem coordenadas. E esses crimes, pela sua enorme quantidade, explicitam uma grande fragilidade dos órgãos governamentais em sua atribuição de prevenir e combater a ocorrência desses eventos.
Essas queimadas transformaram a população em cobaias humanas involuntárias expostas a uma mistura com altas concentrações de gases e materiais particulados tóxicos que alcançaram dezenas de vezes os limites recomendados pela Organização Mundial de Saúde[2], segundo sites que divulgam os dados das estações que monitoram a qualidade do ar[3]. Por isso, sofremos e continuaremos a sofrer por muitos anos um grave prejuízo para saúde pública, com significativos aumentos na morbimortalidade em decorrência da inalação dos componentes tóxicos dos gases resultantes das queimadas, como foi apontado por especialista da Faculdade de Medicina da USP[4].
Essa situação calamitosa ocorre em meio a uma estiagem prolongada que, segundo os especialistas, estão relacionadas às mudanças climáticas decorrentes de gases de efeito estufa - GEE - acumulados na atmosfera e que foram emitidos principalmente por atividades humanas. Essas mudanças estão provocando o aumento da temperatura média da atmosfera e dos oceanos, entre outras alterações, com graves consequências para todos os seres vivos, e a intensificação e maior frequência de eventos climáticas extremos, como secas prolongadas, ondas de calor, ventos mais intensos e fortes chuvas em intervalos mais curtos.
A gravidade sem precedentes dessa situação foi novamente explicitada no relatório Unidos na Ciência, da Organização Meteorológica Mundial [5], lançado no último dia 18 de setembro. Neste afirmam que “sob as políticas atuais, há uma probabilidade de dois terços de aquecimento global de 3°C neste século” e também que “os impactos das mudanças climáticas e do clima perigoso estão revertendo os ganhos de desenvolvimento e ameaçando o bem-estar das pessoas e do planeta” e, por isso, conclamam os países a uma “ação urgente e ambiciosa agora para apoiar o desenvolvimento sustentável, a ação climática e a redução do risco de desastres.”
Esta gravíssima situação sem precedentes exige decisões e ações efetivas agora, em maior quantidade do que as feitas até o momento!
Entre estas, medidas efetivas de mitigação das emissões de GEE que resultem em uma forte redução agora e nos próximos anos, para que o aumento da temperatura não atinja valores catastróficos. E também medidas efetivas de adaptação às mudanças climáticas que resultem em cidades, atividades econômicas, infraestrutura pública (como saúde, mobilidade e geração de energia) e a produção de alimentos e de água potável, entre outras atividades fundamentais, mais resilientes a essas mudanças.
A cidade de São Paulo registrou diversos incêndios em vias, unidades de conservação, parques, praças e outras áreas públicas, além de outros em áreas privadas, segundo a mídia. Por exemplo, foram noticiados incêndios na Serra da Cantareira, no Parque Previdência, no Parque Luís Carlos Prestes e na Mata Esmeralda. Sabemos que existe a Operação Fogo Zero da PMSP, mas, salvo engano, é centrada em áreas de Mata Atlântica do município. Então, essa destruição de áreas verdes por incêndios agravam uma tendência de prejuízo às florestas urbanas e à cobertura arbórea da cidade. Tendência que já presente pela implantação de muitos empreendimentos com licenças ambientais, muitas das quais questionadas, inclusive pelo Ministério Público de SP, como noticiado pela mídia. Mesmo quando as licenças não foram questionadas, são fundamentadas em legislação desatualizada e inadequada para este momento de agravamento da crise climática, pois contrariam diretrizes ambientais como a necessidade de preservação, recuperação e ampliação dessas florestas urbanas e da cobertura arbórea. Diretrizes expressas nos acordos internacionais assumidos pelo Município, como os Objetivos do Desenvolvimento Sustentável da Agenda 2030, incluídos nos artigos 2º e 174 do Plano Diretor Estratégico do Município de São Paulo (lei nº 16.050/2014), como fatores orientadores para aplicação dessa lei.
E, em meio a essa situação desesperante e inaceitável das queimadas, o poder público municipal fez pouco, mesmo em termos de comunicação, pois a população recebeu pouca ou tardiamente orientações por meio de protocolos de saúde que indicassem, entre outras coisas, formas de minimizar as consequências da inalação dessa fumaça tóxica, por exemplo, pelo uso de máscaras classe PFF2 nos dias críticos.
Diante do exposto, considerando a competência municipal de proteger o meio ambiente e de combater a poluição em qualquer de suas formas e de executar uma política de desenvolvimento urbano com objetivo ordenar o pleno desenvolvimento das funções sociais da cidade e garantir o bem-estar de seus habitantes, expressos na Constituição Federal, e considerando a necessidade de providências urgentes e coerentes com a gravidade do momento, indagamos quais providências são realizadas e planejadas pela PMSP e suas secretarias, no âmbito de suas atribuições, em relação a:
1. Prevenção de incêndios: quais ações atuais e planejadas de prevenção da ocorrência de incêndios em unidades de conservação, parques, praças e outras áreas verdes públicas, como parte de um planejamento específico de gestão de riscos, em complementação à Operação Fogo Zero?
2. Gestão de resíduos: quais as ações atuais e planejadas para evitar o acúmulo de materiais que possam ser incendiados em unidades de conservação, parques, praças e outras áreas verdes públicas?
3. Fiscalização e policiamento: quais as ações atuais e planejadas para uma efetiva fiscalização e prevenção da ocorrência criminosa e acidental de incêndios em unidades de conservação, parques, praças e outras áreas verdes públicas?
4. Florestas urbanas e cobertura arbórea: quais as ações atuais e planejadas para preservar, recuperar e ampliar as florestas urbanas e as coberturas arbóreas que têm sido destruídas por queimadas e outras atividades impactantes no município de São Paulo, como as descritas antes?
5. Medidas de adaptação às mudanças climáticas: quais as ações atuais e planejadas de medidas adaptativas para maior resiliência às mudanças climáticas e aos eventos como as fortes ondas de calor, ventos e chuvas que ocorrerão no próximo verão, sobretudo para proteger e ajudar a população mais vulnerável?
6. Medidas de mitigação das emissões: quais as ações atuais e planejadas para reduzir fortemente as emissões de GEE e outros poluentes no município no âmbito do compromisso assumido pelo Brasil, a Contribuição Nacionalmente Determinada (NDC, da sigla em inglês), no escopo do Acordo de Paris?
7. Comunicação: quais as ações atuais e planejadas de divulgação de informações para população em caso de eventos climático extremos, para que não faltem orientações, como ocorrido durante as queimadas e durante o apagão do final de 2023?
Entendemos de suma importância a participação social nos assuntos de gestão pública, de forma que solicitamos um retorno formal conforme as esferas de governo e órgãos envolvidos.
FÓRUM VERDE PERMANENTE DE PARQUES, PRAÇAS E ÁREAS VERDES
[1] INPE, Programa Queimadas do INPE, Monitoramento dos Focos Ativos por Estado, SP, disponível em https://terrabrasilis.dpi.inpe.br/queimadas/situacao-atual/estatisticas/estatisticas_estados/
[2] OMS, 2021, Diretrizes globais de qualidade do ar da OMS, disponível em https://www.who.int/publications/i/item/9789240034228
[3] IQAir, Qualidade do ar próximo à Cidade Universitária – USP – Ipen, São Paulo, disponível em https://www.iqair.com/brazil/sao-paulo/cidade-universitaria-%E2%80%93-usp-%E2%80%93-ipen
[4] O Globo, 12/09/24, Paulo Saldiva: queimadas aumentarão em 20% as internações e a mortalidade nos próximos 14 anos, disponível em https://oglobo.globo.com/blogs/miriam-leitao/post/2024/09/paulo-saldiva-queimadas-aumentarao-em-20percent-as-internacoes-e-a-mortalidade-nos-proximos-14-anos.ghtml
[5] OMM, 18/09/24, Unidos na Ciência: Reiniciar a ação climática, disponível em https://wmo.int/media/news/united-science-reboot-climate-action
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